A notícia de cá dá conta de que a primeira turma da Suprema Corte negou vínculo empregatício entre a Rappi e um entregador, que havia sido reconhecido pela Justiça do Trabalho até no Tribunal Superior do Trabalho.
A notícia da parte mais civilizada do mundo vai em sentido completamente inverso na proteção aos trabalhadores de plataforma digital.
A Cabify, na Espanha, tem seus motoristas contratados como empregados por empresas, que cedem esses trabalhadores para realizar o serviço para a plataforma.
Para o cliente é a mesma experiência, mas os trabalhadores são reconhecidos como empregados, mas das empresas terceirizadas, não da contratante.
O Tribunal Social de Valencia entendeu que se trata de “cesión ilegal de trabajadores”, ou seja, algo como mero fornecimento de mão de obra, e não uma verdadeira terceirização e manteve a autuação realizada pela Inspeção do Trabalho.
Os argumentos da decisão foram:
1) que a empresa, como a Uber, é um serviço de transporte, e não mera intermediação digital;
2) que a propriedade dos meios de produção essenciais, a plataforma digital, é de propriedade da Cabify, pela qual todo o trabalho é entregue aos motoristas, sem a qual o serviço não é realizado, ressaltando que nas regras de uso há expressamente a proibição de oferecimento de transporte diretamente aos clientes da Cabify;
3) foi verificado o poder de direção da empresa, por meio da plataforma digital, com indicação de rota, controle por GPS, geolocalização e avaliação dos clientes na própria plataforma, que tem o poder de dispensar os trabalhadores;
4) o preço da corrida é aplicado pela Cabify e controla as horas de trabalho para que o empregador formal pague os motoristas; 5) a imagem dos veículos e dos condutores é estipulada pela Cabify.
Assim, no país europeu o poder judiciário está preocupado não somente com os direitos dos trabalhadores, mas também com que esses sejam efetivos e completos, identificando corretamente o empregador. Verifica-se também que a corte europeia tem os pés fincados na realidade, não sendo seduzida pelos argumentos ideológicos que não têm nenhuma relação com os fatos, como a de auto-empreendedorismo, liberdade de contratação, empresas tecnológicas etc.
Um dia os ventos da civilização e do progresso voltarão a soprar pelas bandas do sul global.